domingo, fevereiro 25, 2007

Obrigado




"A Magia de uma noite"

"Volto agora a falar-vos de Zeca Afonso e da sua importância para este movimento de cantores comprometidos com o seu tempo e com os destinos do seu país.
O facto de ter vivido em Angola e Moçambique longos períodos da sua vida permitiu-lhe combinar a memória da música popular portuguesa com ritmos e sonoridades que os portugueses conheciam mal. Essa combinação musical de duas culturas, também visível num cantor-autor como Fausto, nascido em Nova Lisboa (actualmente Huambo), contribuiu para acentuar a grande originalidade da sua obra.
Zeca, como já vos disse, não possuía qualquer formação musical, mas nem por isso deixou de ser um compositor genial e um extraordinário intérprete.
Aparentemente distráido, pouco valor dava ao lugar em que actuava quando havia mais cantores em cima do palco, e havia sempre vários. O que o preocupava era fazer passar a mensagem e conseguir comunicar em condições com o seu público. Hoje, não faltará quem chame a esta atitude "amadorismo", mas, para a nossa geração de cantores comprometidos com a vida e o futuro de Portugal, ser amador, não receber "cachet" e não exigir nome destacado no cartaz era uma forma de estar na vida, obedecendo a valores, princípios e causas.
Ninguém, mesmo que o merecesse, queria ser vedeta, corria atrás da fama e procurava a notoriedade dada pelas notícias dos jornais. Tínhamos uma missão que, além de cultural, também era política, e sentíamos orgulho em poder cumpri-la da melhor maneira, precisando de muito pouco para a concretizar. Bastava-nos uma viola, um papel com a letra (no caso, muito frequente, de não a sabermos de cor) e um microfone ligado a uma aparelhagem de fraca qualidade para pormos milhares de pessoas a cantarem connosco, partilhando os nossos sonhos e os nossos ideais. As boas condições técnicas e acústicas viriam muito mais tarde.
Este género de atitude perante o mundo do espectáculo é hoje impensável e, por um lado, ainda bem que assim acontece. É sinal de que há liberdade e de que, em liberdade, se apostou no profissonalismo e na qualidade estética. A nossa estética, tal como as condições de actuação, eramreconhecidamente pobres pois a grande prioridade que nos movia e mobilizava era fazer chegar ao maior número de pessoas o que tinhamos para lhes dizer. De resto, Jósé Afonso sempre se recusou a chamar "espectáculos" às nossas actuações, preferindo designá-las por "sessões populares". Era esse o seu modo de estar na vida e no palco.
[...]
O cantor inquieto, nervoso, em regra preocupado com doenças quase sempre imaginárias, que gostava de ouvir anedotas e se recusava a alinhar na maliência que caracteriza os portugueses, era o melhor e o mais inspirado de todos os criadores que decidiram cultivar este género artístico.
Eu sei que esta descrição vos parece no minímo estranha se comparada com a realidade dos dias de hoje. Mas era, de facto, assim que a coisas se passavam. Vinha um convite, outro convite, combinava-se uma viagem, chegava-se a uma sala fria e com más condições acústicas e actuava-se para quem lá estava.
Unia-nos o companheirismo, a camaradagem, a amizade e a partilha de ideias comuns. Não queríamos enriquecer a cantar, nem ter o nome a letras de ouro em placas de homenagem. Queríamos ser úteis e eficazes, não permitindo que questões secundárias nos dividissem ou afastassem.
[...]
Por vezes, escrevia-se à tarde uma canção que se cantava nessa mesma noite, condenando o golpe de Pinochet no Chile ou o assassinato do dirigente do PAIGC Amílcar Cabral. Às vezes, perdi-se o papelcom o etxto escrito e improvisava-se. Dito assim, tudo parece demasiado ligeiro e impensado. Mas não era. Era assim que esse tempo nos exigia que fossêmos e que actuássemos.
Em Abril de 1973, eu e José Afonso cantámos no dia de abertura do Congresso da Oposição Democrática em Aveiro. Estavam lá milhares de pessoas que cantaram connosco. O que faltava em condições técnicas sobrava em calor humano e em fraternidade. No dia seguinte, abateu-se uma feroz repressão sobre os participantes quando iam em romagem até à campa de um resistente chamado Mário Sacramento, médico e escritor falecido em 1969. Muitas dessas pessoas iam a cantar canções que nós interpretámos na véspera. Depois vieram os polícias, os cães-polícias e fizeram dezenas de feridos e de detenções. E nós tínhamos orgulho pelo facto de podermos vivermomentos como esses, sentindo já no ar o aroma de um Abril que estava quase a chegar.
Em terras como a Marinha Grande, Ferreira do Alentejo ou Cova da Piedade actuámos cercados de polícia de choque e pela PIDE, sem sequer pensarmos nas consequências desse acto temerário. Depois dormíamos uma ou duas semanas fora de casa, temendo a prisão. Zeca Afonso pernoitava frequantemente em casa de amigos para evitar a prisão de que seria vítima cerca de um ano antes do 25 de Abril de 1974.
[...]
No dia 29 de Março de 1974, os cantores de intervenção juntaram-se no Coliseu dos Recreios, em Lisboa, para participarem num espectáculo promovido pela Casa da Imprensa para a entrega dos prémios de Imprensa referentes ao ano anterior.
A Comissão de Censura e a Direcção-Geral de Espectáculos mantiveram a iniciativa proibida até depois da hora marcada para o seu ínicio. Apercebendo-se de que havia milhares de pessoas no interior do eífício e no exterior, acabaram por ceder, mantendo-se porém a decisão de não levanteram os "cortes" feitos em em dezenas de canções (era obrigatório enviar, pelo menos com 15 dias de antecedência, os textos das conções programadas para os espectáculos para a Comissão da Censura e pelo menos três meses antes no caso de gravação de um novo disco).
Debateu-se longamente nos bastidores se, naquelas condições, deveria ou não actuar-se. Os cantores presentes entenderam que sim, já que haviatantas pessoas na expectativa. Optaram, entretanto, por dizer ao público, usando uma explicação que ele facilmente compreenderia, que as letras ou pedaços delas que faltavam se tinham perdido na viagem a caminho do Coliseu. Sorrisis e aplausos foram a reacção cúmplice de quem percebia exactamente o que estava a passar-se.
Para fechar o espectáculo só podia haver um nome, o de José Afonso, obviamente. Mas com que canção? Zeca preferia uma com refrão. Talvez "Venham Mais Cinco" ou "O Que Faz Falta" fossem as ideais, mas tinham sofido cortes substanciais. Acabou por optar por "Grândola, Vila Morena", incluída no disco "Cantigas de Maio", gravado em Paris com José Mário Branco, cuja estrofe inicial diz: "Grândola Vila Morena / terra da fraternidade / o povo é quem mais ordena / dentro de ti, ó cidade", sendo, no fundo, um verdadeiro programa político para a democracia.
Milhares de pessoas levantaram-se dos seus lugares e cantaram de braço dado, ombro com ombro, fraternalmente, a canção escrita anos antes por Zeca Afonso para assinalar o aniversário da Sociedade Fraternidade Grandolense, de Grândola.
No meio da assistência encontravam-se oficiais do Movimento das Forças Armadas que acharam ser aquela a canção adequada para funcionar como senha do levantamento militar de 25 de Abril. Assim aconteceu. E foi desse modo que nessa madrugada histórica milhares de pessoas decidiram sair para as ruas e para as praças, já que, se as vozes que se ouviam eram de Zeca Afonso e de outros cantores da resistência, isso queria dizer que os militares que estavam a derrubar o regime só podiam estar do lado da democracia. E felizmente não se enganavam."
José Jorge Letria
in Zeca Afonso e a Malta das Cantigas




Cordiais Cumprimentos
Hilário

quinta-feira, fevereiro 22, 2007

Universidades portuguesas podem converter-se em fundações

Li há pouco n'acabra.net que o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, Mariano Gago, abriu a possibilidade de as universidades portuguesas se poderem vir a converter em fundações à semelhança do que já acontece noutros países como a Alemanha e a Suécia. Para Mariano Gago as universidades obtêm com esta media “uma maior autonomia na gestão dos recursos humanos, financeiros e patrimoniais”.
Pergunto então a quem me possa esclarecer em que se traduzirá esta alteração no estatuto legal do Ensino Superior. Que vantagens podem daqui advir, e quais as possiveis consequências negativas de tal alteração.
Cordiais Cumprimentos
Hilário
Peritoneal Mesothelioma
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